Varíola dos macacos: MONKEYPOX
O que sabemos sobre os riscos da infecção por Monkeypox na gestante, feto e recém-nascido.
Publicado em 26/08/2022 por Sacha Krolow e revisado pelo Professor Doutor Alberto Abeche.
Resumo:
A varíola humana pode ser transmitida aos seres humanos tanto por animais infectados quanto através do contato direto com feridas infecciosas, crostas ou fluidos corporais e roupas de cama/roupas compartilhadas.
A Organização Mundial da Saúde reconhece a transmissão materno-fetal, a partir da passagem placentária, originada da doença congênita e/ou através de contágio no contato íntimo, durante e após o parto.
A transmissão da varíola dos macacos requer interação próxima prolongada com um indivíduo sintomático que apresente a erupção cutânea e pode transmitir o vírus até que as lesões cicatrizem e as crostas caíam. A extensão em que a infecção assintomática por varíola dos macacos pode ocorrer é desconhecida. O período de incubação é geralmente de 6 a 13 dias, mas pode variar de 5 a 21 dias.
Revisão da literatura:
Há escassez de dados sobre a infecção por varíola durante a gestação, consistindo em um único relato de caso e uma pequena série de casos. Um estudo observacional de uma coorte na República Democrática do Congo com 222 indivíduos sintomáticos internados no hospital com varíola do macaco, entre 2007 e 2011, incluiu quatro mulheres grávidas, sendo que uma mulher com doença leve deu à luz um recém-nascido sem características clínicas de infecção por varíola dos macacos. No entanto, as três mulheres com infecção materna moderada a grave tiveram resultados obstétricos adversos: duas tiveram abortos espontâneos no primeiro trimestre com 6 semanas de gestação e uma teve uma perda no segundo trimestre com 18 semanas de gestação. O feto natimorto apresentou erupção vesicular, hepatomegalia e hidropisia com alta carga viral detectada em tecido fetal, cordão umbilical e placenta – confirmando a transmissão vertical da varíola do macaco.
Uma gestante com 24 semanas de gestação infectada, teve parto prematuro com 30 semanas e o recém-nascido teve uma erupção cutânea generalizada no nascimento semelhante à varíola dos macacos e morreu de desnutrição 6 semanas depois.
Em 23 de julho de 2022, os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), EUA, confirmaram seu primeiro caso de varíola dos macacos em uma mulher grávida. A mulher e seu filho eram supostamente saudáveis. No entanto, o relatório não mencionava a realização ou não de exames confirmatórios no recém-nascido.
A infecção por varíola do macaco no terceiro trimestre ou durante as últimas quatro semanas de gravidez não deve indicar a antecipação do parto, a menos que seja orientada por fatores obstétricos ou urgência clínica em mulheres criticamente doentes.
Orientações do Ministério da Saúde:
O surto de varíola dos macacos de 2022 foi declarado como emergência de saúde pública de interesse internacional em 23 de julho de 2022 pela OMS. No Brasil, já foram confirmados cerca de 868 casos até a data de 26/07/2022.
- Em gestante assintomática pós-exposição com varíola do macaco positiva, recomenda-se o isolamento domiciliar por 21 dias e auto monitoração (temperatura e lesões cutâneas) e novo teste se os sintomas forem persistentes.
- Indica-se hospitalização nos casos moderados, graves e críticos de varíola do macaco com teste positivo.
- O manejo do recém-nascido depende da probabilidade de transmissão vertical, e a imunoglobulina intravenosa de vaccinia (VIGIV) pode ser considerada em neonatos com alto risco de varíola adquirida perinatalmente.
- Amamentação: Embora não se saiba se o vírus está presente no leite materno, a infecção pode ser transmitida ao recém-nascido por contato próximo durante a amamentação, sendo prudente adiar a amamentação até que as erupções cutâneas da mãe tenham cicatrizado. Se, no entanto, a paciente optar por amamentar, o complexo areolopapilar deve estar livre de lesões, o neonato deve estar totalmente enfaixado para reduzir o contato pele a pele e a paciente deve usar máscara facial para reduzir a transmissão de gotículas, devido pela proximidade entre mãe e filho.
- Diagnóstico: Confirmado pelo teste da reação em cadeia da polimerase (PCR) em tempo real ou convencional para o vírus da varíola dos macacos a partir de vesículas ou lesões genitais. Aconselha-se descartar varicela, herpes simples e sífilis, pois podem se assemelhar à varíola dos macacos na gravidez. Necessário monitorização ultrassonográfica fetal em casos de infecção materna pelo vírus da varíola dos macacos, e o manejo subsequente deve ser baseado na presença de anomalias ultrassonográficas, como hepatomegalia fetal ou hidropisia.
- A varíola do macaco pode ter riscos consideráveis para o feto, por isso, é indicado testar gestantes assintomáticas com exposição significativa ao vírus para identificar aquelas que necessitam de acompanhamento ultrassonográfico fetal. No parto, é recomendada avaliação da carga viral no sangue do cordão umbilical e placenta e análise de PCR em tempo real das amostras obtidas do recém-nascido para acompanhamento.
- Vacinação: Ainda não existem dados suficientes, portanto, nenhuma vacina está aprovada para uso na gravidez.
- Tratamento: Atualmente, não há medicação específica para tratar a varíola, sendo na maioria das vezes, indicado o uso de tratamento sintomático para febre e dor, como Dipirona e Paracetamol, evitando-se o ácido acetilsalicílico, e em alguns casos pode-se indicar o uso de antibióticos para prevenção de infecção bacteriana secundária por conta das lesões. Entretanto, o uso de Tecovirimat, um medicamento específico para tratamento de varíola do macaco, foi aprovado pela Health Canada em dezembro de 2021, seguido pela aprovação da Comissão Europeia em janeiro de 2022, pela Food and Drug Administration (FDA) dos Estados Unidos em agosto de 2022 e licenciado pela Agência Europeia de Medicamentos (EMA).
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